
SILÊNCIO
27-05-2012 20:10
Silêncio… Silêncio, por favor… Psiu… Gritamos e colocamos janelas à prova de som, paredes almofadadas, tapetes, forros, etc. O barulho da construção, dos motores dos carros, das buzinas, é o preço da modernidade, mas não é sobre isso que eu quero falar, é sim, sobre o barulho humano de crianças e jovens. Quero falar dos sons das gentes.
Há anos, fala-se sobre a dificuldade de conciliar modernidade com ausência de silêncio e falta de espaço. Amplo espaço silencioso virou artigo de luxo.
Contudo, tenho que confessar que somos nós, adultos, que libertamos e orquestramos este inferno em que o barulho humano transformou o nosso mundo. Consentimos que ruídos ensurdecedores feitos por crianças, jovens e jovens adultos dominem.
Existem certos recintos que não conseguimos evitar, e, assim, ninguém consegue um encontro consigo mesmo, que sem silêncio é impossível.
Nada contra a alegria e tudo contra o som pelo som, só para fazer companhia e evitar esse encontro. Musica de fundo invade o planeta. Ficamos sem refúgio. Solidão e silêncio, viraram palavrão?
Creio que, mesmo em hotéis enormes, é difícil encontrar lugar onde a criança entra sem fazer barulho. Só no bar, onde o escuro à meia-luz é sinal, aliás o único respeitado pelas crianças. Em todos os lugares, seja comboio, avião, café, restaurante, somos envolvidos por gritos e por música, jamais por sussurros.
Como é que as crianças, as mesmas que gritam e galopam pelos corredores, conseguem manter-se em silêncio na missa, no culto, em enterros e em velórios? Como é que respeitam também o cinema?
Pode parecer até que sou contra as crianças, mas não sou, não, pois acho que somos nós, os adultos, por temer o silêncio, que instigamos ou deixamos o barulho vingar á nossa volta.
Quando chega uma ordem de silêncio para cumprir, elas calam-se e param de correr. Vivemos um momento e num universo em que a aversão ao silêncio não se manifesta só com música de fundo, com escape desregulado, com os motoqueiros, mas ainda nos damos ao luxo de libertar qualquer barulhento em qualquer lugar.
O que aconteceria se, de repente, o silêncio caísse sobre nós? Discursos interiores, voz da "consciência", emergiriam. Talvez sejamos todos culpados por maus pensamentos e/ou intenções, o que nos leva a viver em permanente esquiva de nós mesmos.
Com a barulheira que nos rodeia, tornamo-nos surdos a nós mesmos. Parece que o lema atual é: evitar o silêncio, é o dever de todos. Embruteçam os outros. Silêncio é necessário para que se possa manter os homens como seres racionais, criativos, dotados de memória e livres do excesso de stress.
Não quero que o silêncio só exista na calada da noite, no alto das montanhas, no desabitado das matas. Quero-o no contato com as pessoas validas, ricas e alegres, meus semelhantes. Não quero ser insociável, quero ruído normal que me permita falar, sentir e pensar.
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